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Internacional

Alemanha: Heil, Netanyahu

Por Ricardo Rabelo

A alegação de antissemitismo é sempre esgrimida pelo Estado alemão
para enquadrar todos que são solidários com a Palestina Há sempre uma
violência brutal sancionada pelo Estado, da repressão e da vigilância da polícia
e do governo alemão em resposta a protestos pacíficos e boicotes. Isso se
intensificou fortemente desde que o genocídio em Gaza começou em outubro
sob o disfarce também de um pretenso ódio aos judeus
Uma pesquisa recente encomendada pela emissora pública alemã ZDF
mostrou que 61% dos eleitores não acreditam que os ataques de Israel a Gaza
sejam justificados. Apenas 25% acreditam que sim, mesmo assim por falta de
outra opção nas pesquisas oficiais. Talvez a explicação esteja em que o
governo alemão é o segundo maior fornecedor de armas para o exército
israelense, atrás apenas dos EUA.
Além de impulsionar constantemente sua polícia e forças de segurança
para a repressão de manifestantes pacíficos pró-palestinos, o governo também
tomou medidas inusitadas na supressão total da a liberdade de expressão de
seus cidadãos que discordam da posição do governo de apoio a Israel no
genocídio em Gaza. Na Alemanha e na Áustria é proibido falar das atrocidades
em Gaza ou na Cisjordânia, não se pode escrever sobre o massacre dos
palestinos, nem mesmo fazer caricaturas ou gravuras mostrando o
bombardeio permanente da população de Gaza ou mesmo protestar nas ruas,
pacificamente, contra o genocídio. As manifestações são violentamente
interrompidas pela polícia com destacamentos inteiros de policiais, que
agridem as pessoas , rasgam os cartazes prendem sem motivo os
participantes, que são acusados de “suspeita de incitação terrorismo”.
O socialista austríaco e ativista pró-Palestina Michael Pröbsting foi
indiciado pela Procuradoria de Viena, por não ter apagado um vídeo de em que
fazia declarações de apoio à resistência palestina em 7 de outubro. O
julgamento contra Michael Pröbsting ocorreu em 2. Maio de 2024 no Tribunal
Regional de Viena. Michael foi acusado de “Incitação à prática de crimes
terroristas e tolerância a crimes terroristas de acordo com a Seção 282a,
Parágrafo 2, em conjunto com o Parágrafo 1 do StGB”. Se considerado
culpado, ele poderia receber uma prisão de até dois anos. O julgamento
absurdo terminou com um veredito de culpado e uma pena de prisão
condicional de seis meses. Isto mostra o quanto o Estado alemão
institucionalizou uma evidente afronta à liberdade de expressão sob o disfarce
de estar sancionando um “terrorista”.
Em outro protesto no início de abril, a polícia alemã informou aos
manifestantes que bandeiras, faixas, discursos, cânticos e músicas em irlandês

estavam proibidos. A polícia só permite que o alemão e o inglês sejam falados
no protesto em frente ao Reichstag (parlamento federal da Alemanha). O árabe
é permitido por um breve período às 18h. Eles proíbem idiomas que não
entendem, para que possam verificar se algo ilegal está sendo dito.
Ironicamente, até o hebraico é proibido.
A visita da célebre filósofa judia Nancy Fraser à Universidade de Colônia
foi abruptamente cancelada em abril porque ela havia assinado uma carta de
solidariedade pró-palestina. Fraser respondeu, dizendo: “É uma clara violação
da própria política declarada da universidade, bem como dos próprios valores
que eles invocam com o nome Albertus Magnus (…) de liberdade acadêmica,
liberdade de opinião, liberdade de expressão e discussão aberta. Quaisquer
racionalizações complicadas que estejam sendo dadas sobre por que esse
processo supostamente não viola esses valores soam vazias para mim. Isso
também envia um sinal muito forte para todas as pessoas na universidade e
acadêmicos ao redor do mundo: se você ousa, digamos, expressar certas
opiniões sobre certos assuntos políticos, você não será bem-vindo aqui [na
Alemanha]. Tem um efeito aterrador na liberdade de expressão política das
pessoas.”
No início de abril, o movimento pró-palestina faz um acampamento em
frente o Parlamento Alemão, onde pretendiam assistir a acusação da
Nicarágua contra a Alemanha na Corte Internacional de Justiça. A polícia
cercou a manifestação e começou a fazer proibições,tentando proibir a exibição
do julgamento.
Também em meados de abril Berlim sediaria um Congresso sobre a
Palestina em solidariedade ao povo de Gaza e contra a narrativa pró-Israel que
domina a mídia e é defendida por políticos tradicionais, incluindo o partido
verde alemão. No acampamento também foi decidido fazer uma transmissão
em streaming do Congresso. A polícia tenta proibir a transmissão se não
anunciarmos quem fala e o que vão dizer, embora o programa do Congresso
esteja publicado em seu site.
Pouco tempo depois de iniciado o Congresso, a polícia bloqueia a
entrada e as pessoas que iam ao Congresso que não podem entrar, não
podem sair, são acusadas de realizar um ajuntamento ilegal. No acampamento
a transmissão do Congresso começa com o relato de tudo o que a polícia
comunicou que é proibido de dizer no local.
Não permitiram a entrada da imprensa internacional, apenas da mídia
alemã. Apenas uma parte dos participantes com ingressos divide o local com
um grupo de sionistas alemães e cerca de duzentos policiais. Logo a polícia
passou a à repressão dos presentes, cortando a energia e forçando centenas
de participantes a sair. Eles encerraram o Congresso sob o pretexto de
ameaças infundadas de “discursos antissemitas e que glorificam a violência”.

Parte das pessoas que estavam no Congresso reprimido foram para o
acampamento. O jornalista palestino Heb Jamal, foi o primeiro e único orador
do Congresso antes do seu cancelamento. O número de pessoas no
acampamento se multiplica e torna-se um ato de protesto. A polícia persegue,
detém, identifica e registra sistematicamente, como costuma fazer em todas as
manifestações.
No dia seguinte, uma manifestação de protesto é convocada. Durante o
fim de semana há streaming de intervenções do congresso que não poderiam
acontecer. Outro dos oradores banidos, o ex-ministro das Finanças grego
Yanis Varoufakis, também partilha na internet a sua intervenção, que foi objeto
de veto alemão, e o conteúdo foi divulgado nas redes. O médico palestino-
britânico Ghassan Abu Sitta, outro orador, foi impedido de entrar em território
alemão e deportado. Abu Sitta é um cirurgião plástico que ajuda aqueles que
sofrem de lesões relacionadas a traumas. Ele fornece assistência médica em
zonas de conflito, particularmente Gaza. Desde abril de 2024 é Reitor da
Universidade de Glagow. Abu Sitta estava programado para falar sobre a
guerra em Gaza para a Câmara Alta francesa no início de maio. No entanto, à
sua chegada ao aeroporto Charles de Gaulle, foi informado pelas autoridades
francesas de que a Alemanha tinha imposto uma proibição à sua entrada na
Europa.
A proeminente jornalista e escritora russo-americana e judia Masha
Gessen recebeu o Prêmio Hannah Arendt de Pensamento Político Ela foi
escolhida pela Fundação Heinrich Böll, da Alemanha, porém, entre a escolha e
a entrega do prêmio, Gessen publicou um ensaio na revista estadunidense
New Yorker com o título “À Sombra do Holocausto”, no qual ela comparou
Gaza ao gueto judeu de Varsóvia durante a ocupação nazista. A entrega do
prêmio foi inicialmente cancelada, mas depois foi realizada sem a presença dos
patrocinadores com uma presença reduzida de 50 convidados. Gessen,
respondeu dizendo: “eu comparei diretamente a política de Israel à dos
nazistas. Não fui a primeira a fazê-lo. Acho que é essencial fazer a comparação
agora.(…) Deveríamos perder o sono todos os dias sobre Gaza, uma vez que a
comparação é válida!” A própria Hannah Arendt, em 1948, escreveu uma carta
aberta que começava assim: “Entre os fenômenos políticos mais perturbadores
dos nossos tempos está o surgimento, no recém-criado Estado de Israel, do
‘Partido da Liberdade’ (Tnuat Haherut), um partido político estreitamente
semelhante na sua organização, métodos, filosofia política e apelo social aos
partidos nazistas e fascistas”
Embora a narrativa dominante na Alemanha afirme que todas essas
ações, incluindo o apoio incondicional do governo alemão a Israel, são
tomadas para proteger os judeus e combater o antissemitismo, o verdadeiro
motivo tem muito a ver com os lucros que seu complexo industrial militar está
obtendo com a venda de armas para Israel.

A submissão do governo ao grande capital alemão e ao imperialismo dos EUA
De acordo com o Ministério da Economia alemão, a Alemanha enviou
equipamentos militares a Israel em 2023 avaliados em cerca de US$ 353
milhões. Isso é cerca de 10 vezes mais do que o aprovado em 2022. De 2019 a
2023, as exportações alemãs representaram 30% das armas compradas por
Israel, de acordo com o Instituto de Estocolmo. Empresas alemãs como
ThyssenKrupp, Mercedes-Benz Group AG, Renk Group, Rheinmetall AG, Rolls-
Royce Holdings plc fornecem a Israel armas ou equipamentos ou peças usadas
pelas Forças de Defesa de Israel.
Talvez essa também seja a razão pela qual representantes do governo
alemão foram os únicos que imediatamente se apressaram em co defender
Israel no julgamento de genocídio apresentado pela África do Sul na Corte
Internacional de Justiça em Haia. A Alemanha entende e pratica o genocídio há
tempos e não foi somente no holausto. Recentemente as vítimas do primeiro
genocídio do século 20 cometido pela Alemanha contra os povos herero e
nama em sua ex-colônia Namíbia foram homenageadas. A Alemanha, um dia
depois da Corte Internacional de Justiça ter ordenado medidas cautelares
contra Israel para a prevenção do genocídio, incluindo a facilitação da entrada
de ajuda humanitária, foi um dos países a retirar a ajuda humanitária à
UNRWA para a Faixa de Gaza com base em acusações sem provas de Israel
que essa agência da ONU tinha funcionários seus envolvidos com o Hamas.
Em 5 de abril de 2024, a Alemanha votou não à resolução da ONU para cessar
o envio de armas para Israel. Logo depois a Alemanha teve que se defender
na Corte Internacional de Justiça, em Haia, das acusações de cumplicidade em
genocídio por um processo movido pela Nicarágua pelas ações descritas
acima.
A Alemanha , com o governo “socialista” de Olaf Scholz sucumbiu
totalmente ao imperialismo norte americano. Além de colocar todo o país . no
apoio e armamento da Ucrânia, o governo adotou a política criminosa de
renúncia ao fornecimento de energia russa, com o cancelamento do gasoduto
North Stream 2, pronto para funcionar depois de pesados investimentos
alemães e russos. Esta atitude do governo está levando o país a um acelerado
processo de desindustrialização, contribuindo para minar por dentro a poderosa
economia alemã, até então a maior da União Europeia e uma das cinco
grandes economias do mundo. Trata-se de um autêntico crime de lesa pátria
conduzido com o apoio do partido verde, um agente do imperialismo norte
americano na Europa.
É evidente que esta política criminosa do governo alemão contra seu
próprio povo não poderia ficar sem reposta.

O anti imperialismo “brando” de um novo partido de esquerda na Alemanha
Em seu discurso na primeira conferência nacional de seu novo partido,
Sahra Wagenknecht exigiu do governo alemão que pare de fornecer armas à
Ucrânia e acabe com o embargo de petróleo e gás à Rússia. Sahra não fica
apenas no discurso. O seu partido BSW, Aliança Sahra Wagenknecht – Razão
e Justiça foi fundado em 8 de janeiro de 2024 com a herança da maior parte
dos deputados do falido partido político alemão A Esquerda. As recentes
pesquisas apontam para um potencial de 15 a 20% do eleitorado alemão votar
nas suas teses.
As propostas de Wagenknecht estabelecem uma base para criar um
novo polo político fundado no interesse nacional da Alemanha em um
momento de colapso da ordem mundial dominada pelos EUA, uma questão
teimosamente rejeitada pelos partidos do” establishment” e seus apoiadores.
O apelo de Wagenknecht para que a Alemanha rompa com a estratégia
dos EUA em relação à Ucrânia e redefina sua relação com os EUA do zero e,
portanto, também com a Rússia, não deve parecer tão arriscado,
especialmente à luz da alta probabilidade de um segundo mandato para
Donald Trump.
Quanto à Ucrânia, já está claro que a guerra, como a do Afeganistão,
terminará com a derrota do Ocidente liderado pelos EUA. As linhas de frente
estão bloqueadas há mais de um ano. Do lado ucraniano, cerca de 400.000
soldados perderam a vida em outubro passado, morrendo, segundo a
presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, “pelos nossos
valores”. Outros, de número equivalente, sofreram ferimentos tão graves que
não puderam ser enviados de volta ao front. No entanto, o governo ucraniano,
encorajado pelos EUA e pela Alemanha, está agarrado aos seus objetivos de
guerra maximalistas: uma “vitória” para a Ucrânia na forma da reconquista da
Crimeia e de todas as partes do país ocupadas pela Rússia, incluindo áreas de
língua russa.
Na própria Ucrânia, a corrupção floresce em escritórios distritais de
recrutamento e consultórios médicos, onde isenções do serviço militar são
compradas em massa por entre US$ 3.000 e US$ 15.000 mostrando que
novamente são os filhos dos trabalhadores que têm que morrer pelos sonhos
da classe média e pelo lucro dos ricos. Parece razoável duvidar, com
Wagenknecht, de que o fornecimento de cada vez mais armas não faz bem a
ninguém, exceto à Rheinmetall e aos outros fabricantes de armas europeus e
americanos.
Entre o início da guerra, em janeiro de 2022, e o final de outubro de
2023, a Alemanha gastou 23,9 bilhões de euros na Ucrânia, dos quais 13,9

bilhões de euros foram exclusivamente para o acolhimento de refugiados
ucranianos, muito mais do que o Reino Unido (13,3 bilhões de euros) e a
França (4,7 bilhões de euros). Há planos para dobrar a ajuda militar direta
alemã de € 4 bilhões para € 8 bilhões até 2025. A UE atribuiu recentemente 50
bilhões de euros à Ucrânia, a pagar ao longo de quatro anos; ou seja, 12,5
bilhões de euros por ano, dos quais 3 bilhões virão da Alemanha.
É duvidoso que isso possa ser financiado pelo orçamento regular da UE.
Os EUA, que haviam contribuído com US$ 71,4 bilhões até outubro de 2023,
aprovaram o pacote de ajuda militar de US$ 61 bilhões à Ucrânia apenas para

  1. Não há possibilidade de substituir a ajuda americana pela ajuda alemã,
    ou europeia, sob a liderança alemã, especialmente devido aos custos
    imprevisíveis, mas gigantescos, da prometida “reconstrução completa” da
    Ucrânia (von der Leyen), que está programada para começar durante a guerra.
    Tudo isso sobrecarregará a Alemanha, especialmente considerando que seu
    Schuldenbremse (‘freio da dívida’), conforme interpretado atualmente pelo
    Tribunal Constitucional alemão, proíbe o governo federal de obter fundos para
    a guerra na Ucrânia por meio de empréstimos adicionais.
    O resultado para a Alemanha é que assumir a liderança na guerra do
    Ocidente contra a Rússia, como exigido pelos EUA e vários dos vizinhos
    europeus da Alemanha, seria uma missão suicida, mesmo ignorando os
    prováveis riscos adicionais à segurança nacional alemã associados a ela.
    Acabar com o fornecimento de armas alemãs à Ucrânia agora, como
    exige Wagenknecht, sinalizaria uma clara rejeição a esse papel e forçaria os
    aliados alemães a repensar o que podem e querem alcançar na Ucrânia; só
    isso o tornaria um elemento indispensável de uma política de segurança alemã
    responsável na e para a Europa.
    O apelo de Wagenknecht por um retorno ao fornecimento de energia
    russo está em linha com o interesse da Alemanha em um fornecimento seguro
    de energia, também para manter a base industrial alemã. Vale mencionar aqui
    que Biden ordenou recentemente a suspensão da construção de instalações de
    exportação de gás natural liquefeito (GNL) dos EUA. Embora isso tenha sido
    declarado por insistência de ambientalistas, também foi uma reação ao
    aumento dos preços internos devido à alta demanda externa. A Alemanha é
    particularmente atingida porque o GNL deveria substituir o petróleo e o gás
    russos, sob pressão dos EUA, e a energia nuclear alemã, a mando dos Verdes.
    Em vez disso, Wagenknecht oferece à Rússia, como incentivo para
    acabar com a guerra na Ucrânia, a perspectiva de uma comunidade
    euroasiática de Estados e economias, nos moldes da Casa Europeia Comum
    de Mikhail Gorbachev, da Parceria para a Paz de Bill Clinton e da Europa
    “Lisboa a Vladivostok” de Vladimir Putin.

O que o novo partido de Wagenknecht oferece, em vez disso, são
relações econômicas de longo prazo, para as quais os gasodutos do Mar
Báltico, explodidos pelos EUA, devem ser restaurados. Acordos de controle de
armas e desarmamento, como os que os EUA sistematicamente cancelaram
desde a virada do século, devem ser alcançados. O caminho para a Alemanha
garantir a paz é libertar-se das garras geoestratégicas dos Estados Unidos,
guiando-se pelos interesses da sobrevivência nacional, em vez de ficar presa
em um Nibelungentreue, ou seja, lealdade à reivindicação americana

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