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Eleições na França: o avanço da esquerda

Por Ricardo Rabelo

PUBLICADO EM: 19/07/2024


O segundo turno das eleições francesas derrotou a extrema direita, que ficou em terceiro lugar, e deu vitória surpreendente à esquerda da Nova Frente Popular, mantendo Macron e seu partido derrotado em terceiro lugar. Macron, no entanto, operou para não reconhecer a vitória da esquerda, adiando a escolha do primeiro-ministro e afirmando que não aceitava a França Insubmissa no poder. Isto significa que o programa comum da Frente Popular, que garante algumas conquistas populares importantes, pode não ser aplicado. O Partido Socialista só aceita que seja indicado um primeiro-ministro da Frente Popular se for do seu partido ou um tecnocrata “neutro”. O irônico desse proposta é que o PS estava praticamente extinto, e só obteve uma votação expressiva pelo efeito da “onda antifascista” desencadeada pela chamada “Frente Republicana” que envolveu um eficiente mecanismo de retirada de candidatos que estivessem em terceiro lugar nos distritos em que o Reagrupamento Nacional de Marie Le Pen tinha ficado em primeiro lugar no 1⁠º Turno.

No segundo turno, foram divulgados resultados que apontavam a hegemonia Nova Frente Popular, que obteve 182 deputados, ficando o partido de Macron Juntos em segundo lugar com 168 deputados, relegando para a última posição a extrema-direita de Marie Le Pen que obteve apenas 143 deputados. Por sua vez, os republicanos ficaram com 45.

O resultado foi amplamente comemorado por multidões que lotaram, em Paris, a Place de la République, e em locais semelhantes em Lyon, Marselha e várias outras cidades francesas. A derrota do partido de Le Pen e Bardella, mas também as derrotas de apoiadores do genocídio na Palestina. Apesar da sua capacidade de arrebatar o voto de grandes setores da população francesa, a extrema-direita falhou pela terceira vez desde 2017 na reta final. O período entre os dois turnos foi caracterizado por uma autêntica insurreição popular em que milhões de pessoas foram às ruas mostrando toda sua fúria pela ameaça fascista representada não só pelo partido de Le Pen, mas pelos bandos fascistas e fascistas que provocam a população, principalmente os imigrantes, todos os dias. A verdadeira face do fascismo, caracterizado pela violência social, pela brutalidade racista e islamofóbica da maioria de seus candidatos, fez que a multidão gritasse nas ruas: não passarão!

No entanto, o grande erro da esquerda francesa foi não conseguir hegemonizar a maioria dos distritos, de forma que o mecanismo da renúncia generalizada não fizesse crescer os resultados dos macronistas e, dentro da Nova Frente Popular, do Partido Socialista. Se o esquema freou o crescimento do RN (Partido de Le Pen), a política de frente ampla permitiu reabilitar figuras como Gérald Darmanin ou François Hollande, ambos reeleitos. Se Macron nunca esteve tão fraco, a base presidencial, assim como os Republicanos, salvou-o da ameaça de colapso.

Nesses últimos dias na França, predominou a incerteza. Na ausência de maioria absoluta, estão sendo preparados acordos para determinar quem governará numa situação de crise profunda, marcada pela pressão do mercado e pelas tendências bélicas na Europa. Confrontados com as convulsões políticas que se avizinham, os eleitores da esquerda só devem ter confiança nas próprias forças e nas suas lutas como classe trabalhadora. O regime político da Quinta República, que garante poderes ditatoriais ao Presidente, parece ser eficiente em impedir a efetivação de mudanças esperadas pela população, cuja necessidade a ampla votação na esquerda explicita.

A Composição da Assembleia Francesa ficou assim:

PartidosVotosDeputados
Reunião Nacional8 744 080143
Nova Frente Popular7 004 725182
Juntos6 313 808168
Republicanos1 474 650  45
Outros1 364 964   39


O que é a Nova Frente popular


Formada no calor do impacto da grande votação do partido Reagrupamento Nacional de Le Pen, a Nova Frente Popular buscou resgatar o espírito de unidade das esquerdas que esteve presente na formação da original , em 1936. Ela reúne os partidos Verde, Socialista, Partido Comunista e a França Insubmissa, um movimento político que se destaca por não aderir ao neoliberalismo e não se submeter aos interesses do imperialismo. Nesse aspecto, a Nova Frente Popular, apesar de se colocar contra o genocídio em Gaza e propor o reconhecimento do Estado palestino, incluiu no seu programa a defesa da Ucrânia e uma crítica muito agressiva à Rússia e seu presidente.

Foi incluído em seu programa o seguinte trecho:

“Derrotar a guerra de agressão de Vladimir Putin e garantir que ele seja responsabilizado pelos seus crimes perante a justiça internacional: defender sem fissuras a soberania e a liberdade do povo ucraniano e a integridade das suas fronteiras, entregando as armas necessárias, cancelando a sua dívida externa, apreendendo os bens dos oligarcas que contribuem para o esforço de guerra russo no quadro permitido pelo direito internacional, enviando forças de manutenção da paz para proteger as centrais nucleares, num contexto internacional de tensão e guerra no continente europeu, e trabalhar para o regresso da paz.”

A vitória da esquerda


A esquerda venceu? Podemos considerar com tal apenas a França insubmissa, ainda que com algumas ressalvas. É evidente que não se trata de um partido marxista e revolucionário e seu programa é um programa reformista avançado. Coloca uma série de fases de evolução anunciando algumas reformas importantes que, no seu conjunto, rompem com o neoliberalismo. O Programa da Nova Frente Popular é, na verdade, uma extensão do Programa da França Insubmissa. Mas não podemos considerar que o Partido Socialista e o Partido Verde pretendam realmente implementá-lo. Dessa forma, e enquanto Macron der as cartas , o establishment “atlantista” conseguiu afastar a ameaça de um governo francês independente , seja pela direita ou pela esquerda, o que teria sido um desastre para a sua política anti-russa.

Pouco importa aos atlantistas quem governa na Europa, desde que não saiam do caminho da guerra. Aí está Meloni, em Itália, que pertence à liga de Le Pen, que governa seguindo fielmente as diretrizes da NATO. Assim como a Grécia, que é usada como principal porto de descarga de armas e munições para a Ucrânia, que depois seguem a rota pela Bulgária e pela Romênia, até chegarem às mãos dos carniceiros de Kiev.

No século XXI, ser esquerda é – sem esquecer a consigna de todo o poder para os sovietes – a luta contra a OTAN e tudo o que ela representa; a luta contra a acumulação obscena e imoral do capital nacional e mundial em cada vez menos mãos; e uma Europa independente e socialista em termos marxistas. Nada disso estava em questão na França.

Para derrubar Macron e a extrema-direita, só as lutas dos trabalhadores, da juventude e dos bairros operários podem garantir a implementação das reformas essenciais que estiveram no centro dos debates da campanha da esquerda: a revogação da Reforma da Previdência e aposentadoria aos 60 anos, o aumento do salário mínimo e de todos os salários, a sua indexação à inflação, o fim das medidas autoritárias e racistas. Somente com a mobilização dos trabalhadores será possível concretizar o programa da Nova Frente Popular e fazer recuar a extrema-direita.

As direções do movimento operário, a começar pelas centrais sindicais, devem se colocar à frente dessas lutas com base nas organizações operárias e populares. Uma política claramente independente da classe operária deve colocar na ordem do dia a luta anti-imperialista, não servindo de suporte para a política das grandes potências capitalistas.

Uma primeira decisão unitária


Foi divulgado recentemente que a Nova Frente Popular se unificou na indicação de um nome de consenso para se candidatar à Presidência da Assembléia Nacional. O comunista André Chassaigne, 74, foi escolhido como o candidato único da NFP. Chassaigne disputará o cargo contra Yaël Braun-Pivet, do campo governista e presidente em exercício da Câmara, e Charles de Courson, centrista do grupo independente Liot.

Golpe de Macron faz com que consiga reeleger a Presidente da Assembleia


A macronista Yaël Braun-Pivet, com forte apoio dos republicanos , foi reeleita na quinta-feira para a Presidência da Assembleia Nacional com apenas 13 votos a mais que o candidato da Nova Frente Popular, o comunista André Chassaigne que denunciou “alianças antinaturais que usurparam o veredicto popular expresso nas urnas”.

O ex-ministro Roland Lescure e a deputada da direita republicana Annie Genevard foram eleitos em 19/07/2024 vice-presidentes da Assembleia Nacional, enfrentando os candidatos do RN Sébastien Chenu e Hélène Laporte, vice-presidentes cessantes.
Após duas rodadas de votação caótica, os seis vice-presidentes da câmara baixa são: Naïma Moutchou (Horizontes), Clémence Guetté (França Insubmissa-Nova Frente Popular), Nadège Abomangoli (França Insubmissa-Nova Frente Popular), Xavier Breton (Direita Republicana), Annie Genevard ( Direita Republicana) e Roland Lescure (Juntos).

Candidato de esquerda a Primeiro-Ministro: PS quer votação antes de 23 de Julho


Embora a esquerda ainda não consiga chegar a acordo sobre um nome a propor para primeiro ministro, os socialistas solicitaram EM 19/07²024 uma votação dos deputados dos quatro grupos da Nova Frente Popular antes de 23 de Julho.
” Se apresse. A impaciência dos cidadãos está legitimamente a crescer. A emergência social obriga-nos. O Partido Socialista solicita, portanto, que esta votação dos deputados ocorra o mais tardar até terça-feira, 23 de julho”, escreve o PS em nota de imprensa.

Os socialistas propuseram a economista e especialista em clima Laurence Tubiana para o cargo de primeiro-ministro, candidatura apoiada pelos comunistas e pelos ambientalistas. Querem uma votação dos deputados para decidir entre a sua candidatura e a, anteriormente avançada, da presidente do conselho regional da Reunião, Huguette Bello. Esta última conta com o apoio da França Insubmissa, que a preferem a Laurence Tubiana, que aos seus olhos é demasiado moderada.
A França Insubmissa recusou até agora a votação dos deputados, acreditando que os quatro partidos da Nova Frente Popular devem chegar a acordo sobre um nome. Questionado à noite na TV, o líder da França Insubmissa, Jean-Luc Mélenchon, não apoiou realmente o calendário proposto pelos socialistas.
“Espero que, mais uma vez, façamos tudo o que estiver ao nosso alcance, mas não podemos excluir que não haja nome” nesta data, declarou, denunciando “métodos brutais” do Partido Socialista, que acusou de obstruir a nomeação do primeiro-ministro.

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